Oscar Niemeyer: O arquiteto que driblou a ditadura

O Correio Brazilienze localizou no Arquivo Nacional documentos que mostram como os passos de Oscar Niemeyer eram seguidos pelo regime. Com talento e prestígio, ele conseguiu escapar do controle e continuar o trabalho inovador

O arquiteto Carlos Magalhães, amigo, ex-genro e representante do escritório de Niemeyer em Brasília, diz que a acusação de plágio difundida por militares foi um dos episódios que mais o indispuseram com a ditadura. “O coronel Manso Neto virou inimigo pessoal porque atingiu a obra do Oscar, a coisa que ele mais prezava”, conta Magalhães. “O que existia era uma relação de mestre e aluno. Le Corbusier era uma inspiração. Mas é claro que não houve plágio, o Oscar é dono de um talento enorme, era inventivo, tinha uma cabeça muito pulsante”, comenta Magalhães.

Croqui do aeroporto projetado por Niemeyer, vetado pelos militares
Croqui do aeroporto projetado por Niemeyer, vetado pelos militares

Guerra fria
A relação do arquiteto com a ditadura oscilava entre um contato diplomático para a execução de obras de monumentos e prédios públicos até o conflito declarado, com artigos revoltados de Oscar Niemeyer contra posicionamentos do governo militar. O episódio mais conhecido de atritos entre ele e a ditadura foi a construção do Aeroporto de Brasília. O projeto de um terminal circular, desenhado pelo arquiteto, acabou recusado pelo governo. “A solução de um aeroporto deve ser extensível”, justificou à época o diretor de Engenharia da Aeronáutica, brigadeiro Henrique Castro Neves.

A recusa ao projeto abriu uma guerra entre os militares e Oscar Niemeyer em 1967. O arquiteto, com o apoio de um grupo de colegas, recorreu à Justiça por meio de uma ação popular, em que pedia o direito de executar seu projeto. “Um aeroporto extensível, já naquela época, era solução superada que deviam rejeitar. Circular era a solução correta. Recorri à Justiça. Apresentamos uma ação popular contra a Aeronáutica, mas perdemos. O juiz se deu ao ridículo — que calhorda — de nos condenar a pagar as custas do processo”, relembra Niemeyer, em seu livro de memórias.

Um ministro militar declarou à época que lugar de arquiteto comunista era em Moscou, frase que irritou Niemeyer. Depois do episódio do aeroporto, ele passou a ser perseguido de forma mais ostensiva. “Vivíamos os tempos de Médici, governo fascista. Meus trabalhos começaram então a ser recusados e eu, ameaçado de demissão.”

As rusgas entre Niemeyer e a Aeronáutica persistiram nos anos seguintes. No Arquivo Nacional, a reportagem localizou um ofício confidencial datado de setembro de 1969, que determinava a abertura de inquérito policial militar “para apurar, com profundidade, as atividades subversivas praticadas pelo arquiteto Oscar Niemeyer”. As posições políticas do arquiteto “haviam sido relatadas na exposição apresentada pelo excelentíssimo senhor major brigadeiro-do-ar engenheiro Henrique de Castro Neves”. Justamente o militar que decidira vetar o aeroporto de Niemeyer dois anos antes.

A invasão da Universidade de Brasília pelos militares e a perseguição contra professores e estudantes também atingiram Oscar, que foi docente da instituição. “Já tinha comparecido à polícia política várias vezes. E a pressão continuou. A universidade foi invadida, nossos colegas exonerados e, dela, um dia, nos demitimos, cerca de 200 professores, em protesto contra tanta brutalidade”, recorda-se o arquiteto no livro Curvas do tempo.

Em 1969, os militares abriram inquérito policial para identificar “os responsáveis pelas agitações comuno-estudantis ocorridas na Universidade de Brasília em março de 1968”. O documento está no Arquivo Nacional. O nome de Niemeyer é citado várias vezes. O inquérito diz que ele era “um dos influenciadores de fora para dentro da UnB” e que Oscar e outros membros da Associação dos Arquitetos de Brasília “colaboraram, sobretudo, com a FAU (Faculdade de Arquitetura), que é órgão subversivo.”

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