Decisão da justiça determina acesso da CNV às folhas de alterações de coronel vinculado à repressão política

casa da morte

Casa da Morte, centro de tortura clandestino em Petrópolis, no Rio de Janeiro.

A desembargadora federal Vera Lúcia Lima, da oitava turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio de Janeiro) aceitou recurso da Advocacia Geral da União e determinou a suspensão dos efeitos da liminar obtida pela viúva do coronel reformado do Exército, Cyro Guedes Etchegoyen, que proibia o acesso da Comissão Nacional da Verdade à folha de alterações do militar, que integrou o Centro de Informações do Exército e teria comandado, segundo depoimento do coronel Paulo Malhães, a implementação da Casa da Morte, centro de tortura clandestino em Petrópolis, no Rio de Janeiro.

Em setembro de 2014, a CNV obteve junto ao Ministério da Defesa e comandos militares acesso a informações de folhas de alterações de militares da Marinha, Exército e Aeronáutica, com o objetivo de esclarecer graves violações de direitos humanos e identificar estruturas e locais associados a essas violações. Em consonância com o disposto na Lei de Acesso à Informação, a disponibilização dessas informações foi realizado mediante metodologia acordada entre a CNV e o Ministério da Defesa, que assegurou a proteção de informações pessoais, sem prejuízo do acesso a informações administrativas essenciais para o cumprimento dos objetivos da Comissão Nacional da Verdade.

No final de agosto deste ano, contudo, a viúva do Coronel Etchegoyen, Mary Alves da Cunha Etchegoyen, ingressou na 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro com ação ordinária com pedido de liminar para que não fossem entregues à CNV a folha de alterações de seu falecido marido. Segundo a petição apresentada, o objetivo da ação era “preservar a memória do seu marido, seu direito personalíssimo à imagem, honra e dignidade”.

A liminar foi concedida pelo juízo de primeira instância e a CNV recorreu por meio de um agravo de instrumento interposto pela Procuradoria Regional da União (AGU), alegando, em síntese, o uso de seu poder de requisição, previsto pela lei 12528/2011, a natureza administrativa (não pessoal) das folhas de alterações e que a CNV e o Ministério da Defesa acordaram “um rigoroso procedimento de acesso às folhas de alterações, garantindo que os dados extremamente pessoais não fossem disponibilizados”.

As folhas de alterações são documentos, de responsabilidade da organização militar, destinados ao registro semestral das alterações relativas aos militares da ativa, como mudança de posto, promoções, recebimento de diárias para deslocamento, publicadas nos boletins internos das forças em que atuaram os militares.

As folhas de alterações foram entregues à CNV após parecer jurídico elaborado este ano pelo Ministério da Defesa que concluiu que as folhas de alterações trazem informações sobre assentos funcionais que são, essencialmente, “de natureza administrativa e não pessoais”.

Antes de conceder o efeito suspensivo, a desembargadora Vera Lúcia pediu o parecer do Ministério Público Federal. O procurador regional da República Aluísio Firmo Guimarães da Silva, da Procuradoria Regional da República da 2ª Região, em detalhado parecer, emitido no último dia 14, afirma que a “gravidade dos fatos apurados pela CNV justifica os poderes a ela conferidos, inclusive, documentos sigilosos”.

O procurador lembrou ainda que, independentemente das previsões legais de respeito à intimidade que devem ser preservadas pelos órgãos públicos, o artigo 21 da Lei de Acesso à Informação (lei 12527/2011), promulgada no mesmo dia em que foi instalada a Comissão Nacional da Verdade, prevê o acesso irrestrito a informações ligadas às graves violações de direitos humanos praticadas por agentes públicos ou a mando de autoridades públicas.

Por fim, o procurador regional da República afirmou que há provas suficientes para justificar o pedido das folhas de alterações de Etchegoyen, uma vez que, em depoimento à CNV em março deste ano, o coronel reformado do Exército Paulo Malhães, que atuou na Casa da Morte de Petrópolis, afirmou que o chefe da casa era  o chefe de contrainformações. Ao ser indagado quem era esse chefe, Malhães indicou Etchegoyen e disse que ele frequentava a casa eventualmente e que usava o codinome de dr. Bruno.

Fonte- Comissão Nacional da Verdade

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